No último dia 14 de janeiro, no início da noite, um grupo de fascistas/neonazistas promoveu um atentado no término de uma atividade do Centro de Cultura Libertária da Amazônia (CCLA) no centro da cidade de Belém do Pará. Munidos de fogos de artifícios, em um carro preto com placas protegidas por papelão, jogaram bombas sobre nossa sede. A ação foi rápida, calculada e precisa demonstrando, assim, o grau de planejamento e desprezo pela vida das pessoas.
Contudo, é preciso ressaltar que esse mesmo lugar atacado com fogos de artifício promove atividades pedagógicas com crianças através de metodologias de educação popular, com meninos e meninas. No momento da ação a atividade que ocorria era de adultos. Se fosse outro dia e horário essas crianças correriam um sério risco de ficar com sequelas psicológicas e físicas por conta dos traumas provocados por um ataque desse tipo.
Atacar um espaço desse é, portanto, mais uma prova da falta de respeito pela integridade e até pela vida alheia por parte daqueles que apoiam princípios baseados no ódio, seja este motivado por diferença ideológica ou por discriminação racial, de gênero, de etnia ou de classe: pessoas pertencentes a setores minoritários politicamente da sociedade, negros, indígenas, pessoas trans, mulheres e tudo o que foge ao padrão fascista (macho, branco, cristão, de classe privilegiada, etc.) são alvos permanentes dessas formas de violência que o CCLA sofreu no dia 14/01.
A atual conjuntura das lutas de classes e seu recrudescimento através do avanço de ideologias fascistas/neonazistas pelo mundo inteiro, manejadas por grupos ultraliberais, de extrema direita e conservadores de plantão continuam sua escalada de ódio e violência contra organizações políticas, movimentos sociais, ativistas e toda uma constelação de lutadores e lutadoras sociais que jamais se amedrontarão diante desse cenário.
Em Belém, esse bloco fascista e ultraliberal se articula entorno de setores da milícia capitaneada por um ex-delegado e, hoje, deputado federal. Ávidos em tomar o poder local municipal e fazer o novo prefeito do município, intensificarão práticas como essas atacando primeiramente os anarquistas para depois ampliar atingindo outros setores políticos da sociedade. Fiquemos alertas. Alertas anti-fascistas.
De fato, nós somos e sempre seremos a primeira linha de combate às ideias perigosas deles, mas depois dos anarquistas, os nossos companheiros de outras organizações podem muito facilmente se tornar alvo dos ataques fascistas: todos os setores que compartilham pautas de luta antifascista têm que sentir-se atacados através de nós, pois os fascistas só esperam uma falha nas nossas “frentes” para aproveitar dessa fraqueza.
Outro aspecto que destacamos deste lamentável fato é a sua possibilidade de atuar num cenário que engloba múltiplas escalas. Do global ao regional/local, a ação política do fascismo não é fruto apenas de uma conjuntura específica ou pontual, ele é vinculado às engrenagens do colonialismo que tem uma de suas expressões baseados nas grandes potências mundiais e seus conglomerados econômico-bélicos, que cresceram e se beneficiaram com o capitalismo. Individualismo, consumismo e tipos modernos de escravidão/servidão se conjugam com práticas ancoradas na exclusão e na sociabilidade perversa, meritocrata e competitiva, que repudia a diversidade e a pluralidade para perpetuar seu domínio e promover a homogeneização e/ou o genocídio de povos que se expressam através de territórios comuns, coletivos.
Reivindicamos princípios como autodefesa, resistência, apoio mútuo e solidariedade que se convertem em ferramentas fundamentais para a situação atual. Não se trata de uma visão de mundo, esses grupos fascistas/neonazistas atuam de forma similar e têm como um de seus objetivos a homogeneização do humano e das sociedades: toda forma de expressão e existências, inclusive da natureza, contrária aos seus sistemas machista, patriarcal, monoteísta, racista e plutocrático são alvos de seus ataques.
É neste cenário que vemos o Brasil e as Amazônias envolvidos. Mergulhados numa crise que envolve múltiplos tempos, escalas e lugares, tanto no campo como na cidade, de norte a sul, em todos os quadrantes deste território são produzidas e reproduzidas a lógica da colonização e da colonialidade. Lógica muitas vezes esquecidas na interpretação das lutas de classes no sistema capitalista. Mas que mantém a mesma lógica do privilégio das classes dominantes. As mesmas donas dos meios de produção, dos grandes latifúndios e das grandes fortunas.
Nas Amazônias, a brutalidade da classe dominante e dos seus aliados fascistas contra os povos do campo, das florestas e das águas permanece numa espiral crescente. Utilizando tudo que estiver ao alcance para desenvolver o seu processo de expropriação dos bens da natureza e na exploração da força de trabalho de nosso povo. No cenário estadual, o Governo Helder coopta a maioria dos setores da esquerda. Tudo isso contribuindo para uma política de morte, uma necro-política confirmada pelos dados produzidos pela CPT que aponta no ano de 2022 a Amazônia legal como a região de maior conflito com mortes no campo.
Finalizamos dizendo que o CCLA é fruto de um longo processo de enraizamento do anarquismo no solo dos trópicos úmidos brasileiro. Uma construção organizativa que começa no fim da ditadura militar brasileira, constituída e forjada na cultura de luta e de resistência que emana da classe trabalhadora e de todos setores subalternizados da sociedade. De uma região que tem na rebeldia dos cabanos, o gás necessário para suas lutas cotidianas. Esse posicionamento político incomoda e, assim, continuaremos a incomodar, pois não nos ajustaremos e sucumbiremos a essa política de morte e medo apresentada pelo projeto fascista.
Viva ao Anarquismo!
Viva à Amazônia livre e em luta!
Ao fascismo, nem água!